A impressão mais relevante que Cachoeirinha me passa está na sensação de que é uma cidade marrom. Principalmente nos prédios, mas também nas árvores, pessoas, calçadas e cachorros costumo vislumbrar uma fina camada de poeira. Cobre rostos, cabelos, latarias, janelas e fachadas. No ar há uma fuligem parecida com restos de tijolo, como se todo o município fosse uma imensa olaria. É realmente desagradável e credito a isso a cretinice da cidade e de suas pessoas. Estão todos entregues à poeira, como numa daquelas tiras nonsense do Laerte.
Parece que a cidade foi ficando mais marrom conforme fui crescendo. Talvez por não mais freqüentar as ruas e bairros onde costumava viver e que ainda guardam alguma luminosidade translúcida, onde a pele das pessoas é mais clara e as folhas das plantas ainda respiram. Tudo mais é pó e partículas de argila. É a desgraça da cidade, seu carma, sua bolha assassina. Candidatos são derrotados graças à poeira. Bares fecham por causa da poeira. Homicídios ocorrem devido às nuvens de argila que sufocam a cidade.
Como moro aqui e sou engolido pela poeira desde 1982, talvez as pessoas também me enxerguem marrom, talvez eu também seja cretino. É improvável que venha a ser derrotado em uma eleição, mas tenho medo de cometer um homicídio.