"Os talões de cheques eram os 'troféus de guerra' mais cobiçados. Inúmeras famílias de desaparecidos foram procuradas, nas semanas seguintes aos seus seqüestros, por comerciantes que tentavam resgatar polpudos cheques sem fundos. Outras tiveram suspresas ainda mais amargas. Tornou-se praxe nas sessões de tortura os oficiais e sub-oficiais obrigarem suas vítimas, sob promessas ou ameaças, a assinar transferências de saldos bancários e de cadernetas de poupança para as contas dos algozes. Houve inúmeros casos também de transferências forçadas de carros e imóveis. Pelo menos um comissários de polícia foi identificado no Tribunal como tendo arrebanhado em seu nome vinte casas com esse método. Em 1978, três conhecidos torturadores da Escola de Mecânica da Marinha, liderados pelo capitão-de-corveta Jorge Eduardo Acosta, chegaram a abrir uma empresa imobiliária no bairro de Belgrano, zona de classe média de Buenos Aires, para vender propriedades tomadas a seqüestrados que foram em seguida assassinados.Outor efeito do sistema criminoso em vigor na Argentina foi a formação de quadros para a delinqüência comum. Durante o julgamento dos generais, o advogado do ex-presidente Jorge Videla, Carlos Tavares, tentou impugnar o testemunho de um ex-agente da Polícia, Armando Luchina, argumentando que ele havia sido processado recentemente por roubos de carros. Luchinam então, pediu a palavra e explicou aos juízes que aprendera a roubar carros num curso dado na sede da Polícia Federal:- Noventa por cento dos seqüestros eram feitos com carros roubados - explicou o policial."[A noite dos generais - Os bastidores do terror militar na Argentina. José Meirelles Passos. Editora Brasiliense, 1986.]
Nem ditadura brasileiro faz direito. Também não sabe rebelar-se contra regimes totalitários. Na Argentina, o quartelaço foi muito mais absurdo e violento, e, mesmo assim, durou apenas oito anos. Os mandantes foram todos julgados e punidos. Obviamente, porém, o espírito maloqueiro dos militares esteve presente, como o trecho comprova.